Dois entrevistados nas minhas pesquisas para “Nem vem que não tem: A Vida e o Veneno de Wilson Simonal” morreram hoje.

Paulo Vanzolini,genial sambista e zoólogo reconhecido, dias antes do meu deadline, deu uma entrevista ao Estadão dizendo que Simonal era, sim, delator, que “todo mundo sabia” o nome dos artistas que o cantor havia delatado ao DOPS durante os anos de chumbo. Imediatamente, procurei Vanzolini, que sustentou sua declaração, embora tenha se queixado de não ter sido informado que as câmeras do Estadão estivessem ligadas. Apesar de prestativo, não soube me dar a informação mais importante: o nome de ao menos um artista que tivesse sido delatado por Simonal. “Não era assim”, ele disse. “Era sempre uma coisa vaga. Mas o meu primo, o radialista Henrique Lobo, com certeza saberia o nome de alguém. Só que ele já morreu. Raul Duarte também saberia. Só que ele também já morreu.”

Saulo Ramos, o jurista, consultor geral da República e ministro do governo de José Sarney, me recebeu em sua enorme casa em Ribeirão Preto. Levei a ele as 600 páginas do processo que condenou Simonal à prisão em 1974 e que começou com o “sequestro e tortura” de seu contador Raphael Viviani três anos antes. Saulo leu, leu, leu, leu tudo atentamente, na minha frente, comentando os trechos mais curiosos até que, num rompante, me perguntou:

“Ricardo, quantos foram os acusados?”
“Cinco, eu respondi. Três policiais, o Simonal e o motorista do Simonal”.
“E quantos foram condenados?”, ele quis saber.
“Três”, eu respondi. “Dois dos policiais menores e o Simonal”.
“E quantos foram pra cadeia?”, ele perguntou.
“Só o Simonal”, eu disse.

“Então ele não era colaborador do regime militar”, Saulo Ramos disse, fechando a pasta com convicção (depois ele reabriria). “Eu GARANTO pra você que um colaborador do regime militar nunca seria preso, nunca seria condenado nem em processo de adultério”.

Um garantia de um lado, outro garantia de outro. Que garantia temos nessa vida? Dois grandes caras, Paulo Vanzolini e Saulo Ramos, que descansem em paz.